Violência conjugal e familiar. Esse foi o tema central da audiência pública (A Rede de Enfrentamento à Violência Doméstica em Uberlândia e sua Atuação para a Garantia dos Direitos das Mulheres) realizada nesta quarta-feira, dia 23 março, de forma virtual pelas vereadoras organizadoras Amanda Gondim (PDT) e Cláudia Guerra (PDT). O evento encerrou a programação do legislativo municipal para o mês das mulheres.
A vereadora Gláucia da Saúde (PSDB), 1ª vice-presidente, abriu a audiência pública comemorando o encontro de pessoas que há anos lutam pelo fim da violência contra as mulheres, familiar e conjugal, o encontro de pessoas que fazem a diferença quando o assunto é violência doméstica. “Precisamos muito de vocês todos. Contamos com vocês que fazem toda a diferença. Sempre!”, encerrou.
A ativista que luta contra a violência familiar há pelo menos 20 anos, a vereadora Cláudia Guerra, ressaltou números alarmantes e preocupantes, entre eles o país aparecer em quinto lugar em feminicídio. Ela lembrou que quando o assunto é a violência contra a mulher, aquelas que mais sofrem são a pobre e a negra. Para o enfrentamento dessa triste realidade, a vereadora propõe de pequenas ações práticas a projetos de lei que promovam uma sociedade mais igualitária. Para ela, é possível relacionar-se sem precisar lançar mão de recursos da violência. "A cultura da paz se constrói no dia a dia, na educação informal e formal para a igualdade e autonomia das mulheres, pois onde tem violência doméstica, a família inteira sai machucada. Estudos revelam que transformar a vida das mulheres melhora todas as vidas”, explica.
A vereadora Amanda Gondim (PDT) também sugere a aplicação de várias ações práticas em um espaço propositivo e multidisciplinar para o atendimento à mulher vítima da violência doméstica. Ela explica que deve ser um espaço qualificado para o debate, para reflexões, um espaço para ser compartilhado por todos. Para a legisladora, a rede de proteção precisa ter os dispositivos necessários para seu devido funcionamento e suas atividades devem ser incentivadas por políticas públicas construídas com diagnósticos reais e efetivos, que contemplem a diversidade de mulheres em situação de violência, bem como a sua prevenção.
O promotor de justiça, Moisés Batista Abdala, representante do Ministério Público de Minas Gerais (MPMG), apresentou as ações que atualmente são implementadas na esfera judicial (preventivas e repressivas), as quais ele classifica de medidas cabíveis, deixando bem claro que tudo pode melhorar, principalmente a qualidade do atendimento à vítima, cuja demanda parece não parar de crescer. Em números, ele conta que foram 583 (2019) contra 734 (2020) medidas protetivas, um acréscimo de 30%.
Para o promotor de justiça Fábio de Paula Carvalho, a Lei Maria da Penha funciona muito bem como intervenção efetiva quando a violência doméstica se encontra nos primeiros estágios, mas lamenta que muitas vezes a própria vítima despreza ajuda. “Eu investiria em campanhas educativas, na prevenção e em noções básicas de cidadania, assim como na criação de grupos para reflexão. O uso e o abuso de álcool e drogas são as principais causas da violência contra a mulher. Para completar eu fortaleceria os órgãos existentes no Município de Uberlândia”, sugere.
Iara Helena Magalhães, representante da ONG - SOS Mulher e Família Uberlândia, diz ser preciso trabalhar a cultura da paz como ferramenta de resgate da humanidade daqueles que há muito a perderam, envolvidos pela violência praticada e sofrida no próprio lar. De acordo com ela, os centros de referência precisam apresentar projetos e investir nos atendimentos que minimizem a violência doméstica. Ela conta que apesar da pandemia, o acolhimento de mulheres ano passado apresentou um aumento considerável, mesmo que esse fosse às vezes apenas um pedido de socorro. “Percebo que as mulheres acolhidas apresentam proporcionalmente o mesmo problema: o desemprego”, finaliza.
Raquel Tibery, representante do Conselho Municipal dos Direitos das Mulheres, diz que essa violência é fruto de uma sociedade sexista, machista, patriarcal, homofóbica, entre outros predicativos. Ela lamenta o crescimento da violência enquanto os equipamentos permanecem congelados em todos os sentidos, de recursos humanos a recursos financeiros e o descaso e a falta de empatia na hora do atendimento quando estão em pleno funcionamento. “É preciso, acima de tudo, combater a naturalização do machismo”, conclui.
O 2º Tenente da Polícia Militar de Minas Gerais (PM) Jorge de Almeida, representante da Patrulha de Prevenção à Violência Doméstica (PPVD), relata o trabalho da corporação no sentido de inibir a violência conjugal e familiar, quase sempre a primeira a chegar. “Por isso é muito importante a capacitação dos militares que trabalham no primeiro contato com a vítima, muitas vezes preventivo porque inibir e desmotivar a prática da violência doméstica é o nosso objetivo. É realmente um trabalho preventivo para que a violência de fato não chegue a ocorrer”, explica. Por fim, ele pede a todas as mulheres que não se calem diante da violência sofrida e que busquem ajuda, sempre.
A representante da Defensoria Pública do Estado de Minas Gerais (DPMG), Bárbara Silveira Machado Bissochi, menciona a cooperação voluntária dos defensores que oferecem além de orientação jurídica a propositura de ações de acordo com o perfil da vítima. “Lamento não existir ainda na cidade um núcleo exclusivo para a defesa da mulher, um defensor exclusivo para a área da violência conjugal e familiar. Defendo o trabalho em rede de forma efetiva que iniba a violência contra a mulher. Sugiro ações educativas e preventivas que impeçam o ato violento”, acrescenta.
Neiva Flávia de Oliveira (Todas por Elas – Universidade Federal de Uberlândia – UFU) conta que infelizmente todos os atendimentos estão suspensos, apesar do crescimento da demanda. Segundo ela, a pandemia tem dificultado bastante o dia a dia do projeto, dificuldades inerentes ao funcionamento do projeto. Apesar de todas os problemas, sobra espaço para comemorar o fim da defesa da honra. Concluindo, defende a memória, através da educação, como o caminho para a transformação, cujo maior desafio é a construção de um presente mais justo e um futuro mais igualitário para as mulheres.
Renata Catani, representante do Núcleo de Atenção Integral às Vítimas de Agressão Sexual (Nuavidas), não esconde que os desafios são muitos, que a pandemia tem impedido alguns atendimentos, aqueles que não podem ser virtuais. Ela confirma o aumento do número de casos graves, quando muitos chegaram a dobrar em 2020. “Esse ano, com a pandemia, registramos queda na demanda”, reitera. Para Catani, a prevenção é o maior desafio porque os traumas da violência, principalmente de ordem sexual, precisam ser acompanhados, muitos pelo resto da vida.
Sayonara Naider Bonfim Nogueira, representante do Núcleo de Diversidade Sexual da Prefeitura Municipal de Uberlândia, lembra que não pode haver diferença no atendimento a mulheres que são diferentes. Para ela, o tratamento deve ser igualitário a fim de promover a cidadania e a inclusão daquelas que precisam voltar para o mercado de trabalho.
Segundo a diretora de Proteção Social à Mulher – Casa da Mulher – Adriana Couto Ladeira, a entidade é a porta de entrada das vítimas da violência doméstica que são encaminhadas, de acordo com o caso de cada uma, à Defensoria Pública do Estado de Minas Gerais – Uberlândia. Ela conta que o trabalho da casa também é de prevenção, acolhida, orientação e destaca a escuta empática como forma de empoderamento, encorajamento da mulher e acrescenta que a promoção da cidadania, a defesa dos direitos humanos e a profissionalização dessas mulheres também fazem parte do dia a dia de todos os profissionais que com ela trabalham para despertar consciências e sensibilizar todas as atendidas.
Deivid Tiago da Silva Palmezoni, representante dos conselhos tutelares, se coloca junto nessa luta após dizer que a mulher merece o que há de melhor na vida. Ele pede que elas nunca acreditem que merecem ser violentadas. “Mulheres merecem carinho e respeito, assim como as crianças e os jovens vítimas da violência doméstica”, conclui.
A juíza e diretora do Fórum da Comarca de Uberlândia, Maria Elisa Taglialegna, aposta na criação da Vara da Mulher, especializada no julgamento de casos de violência familiar, doméstica. Ela diz que para o trabalho ser especializado é preciso buscar o apoio de todos os órgãos envolvidos nessa luta, aumentar a rede de proteção e procurar parcerias junto à iniciativa privada, junto a pessoas sensibilizadas com a causa e que podem nos ajudar. A juíza acredita que somente uma vara especializada pode receber e realizar o atendimento correto, necessário e apropriado. Ela também se coloca à disposição de todos para ajudar a inibir a violência conjugal e familiar em um país que sofre em todos os sentidos, principalmente quando o assunto é a ética.
Participaram do evento o vereador Fabão (PROS), a vereadora Gilvan Masferrer (Democracia Cristã), a vereadora Liza Prado (MDB), a vereadora Thaís Andrade (PV) e o vereador Walquir Amaral (SD).
Números
De acordo com dados disponibilizados pela Secretaria de Estado de Justiça e Segurança Pública de Minas Gerais, o Município de Uberlândia registrou, de janeiro a novembro de 2020, 3.676 ocorrências de violência doméstica e familiar contra a mulher. Tal realidade, marcada ainda pela subnotificação e acentuada durante o contexto de isolamento social ocasionado pela pandemia, deve ser tema de atenção e proposição por parte do poder público. Nesse sentido, a rede local de enfrentamento à violência doméstica contra a mulher cumpre um papel importante.
Além do reconhecimento e do engajamento na efetivação dos direitos das mulheres, é necessário que esta rede esteja cada vez mais conectada de modo a integrar os mecanismos de proteção e de conscientização do Estado com a sociedade civil. A audiência cumpre, portanto, a responsabilidade de mediação do diálogo e espaço de fomento à participação social, assim como subsídio às proposições da Câmara Municipal de Uberlândia para a temática abordada.
Fonte: Departamento de Comunicação CMU (Frederico Queiroz)