A Câmara de Uberlândia promoveu, na tarde desta segunda-feira (10), a audiência pública “Abuso e exploração sexual de crianças e adolescentes”, com a proposta de promover a luta, combater e amparar crianças e jovens não só em Uberlândia, mas em todo país. O tema é específico para o mês, uma vez que o dia 18 de maio é o Dia Nacional de Combate à Exploração Infantil e para o vereador Ronaldo Tannús (PL), autor da iniciativa, essa é uma oportunidade de trazer a discussão para dentro do legislativo.
Representantes de diversos órgãos jurídicos do Brasil e de Uberlândia foram convidados para falar na audiência, que contou com a presença dos vereadores Antônio Queijinho (Cidadania), Cristiano Caporezzo (Patriota), Cláudia Guerra (PDT), Gláucia da Saúde (PSDB), Liza Prado (MDB) e Sargento Ednaldo (PP).
Danusa Biasi, presidente do Insituto Carrossel, uma ONG atuante em Uberlândia no combate à violência sexual contra crianças e adolescentes, chamou a atenção para a prevenção como o melhor caminho para acabar com a pedofilia. Ela lembrou o caso da menina Araceli Cabrera Sánchez Crespo, vítima de terrível violência sexual e física no estado do Espírito Santo em 1973 para lamentar o aumento cada vez maior no número de casos no país e cobrou um engajamento da sociedade, uma vez que o maior percentual dos números acontece em casa, e do poder público para se ter êxito no combate a esse crime.
A conselheira tutelar Larissa Lira de ênfase sobre o histórico de desrespeito, violências e abandonos vividos pelas crianças e adolescentes no Brasil antes do reconhecimento de seus direitos na Constituição de 1988 e depois anos após, com a criação do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA). Sobre o mês de conscientização sobre a violência sexual contra criança e adolescentes, a conselheira afirmou que a pedofilia é uma doença sem cura, que pessoas com essa “patologia” necessitam de tratamento e que o Código Penal não traz em lei o crime de pedofilia, mas o crime de estupro contra vulnerável. Lira também chamou atenção quanto ao acesso de crianças a materiais pornográficos e o perigo dos criminosos cibernéticos.
Citando o artigo 227 da Constituição, que traz como prioridade absoluta o direito da criança e do adolescente, o promotor de Justiça Casé Fortes, atuante na cidade de Divinópolis (MG), disse que a violência e crime contra os menores trazem tristeza, raiva, revolta por ferirem esses direitos. Ele classificou o abusador como covarde, por isso a necessidade dos adultos e protetores estarem atentos, sendo essa postura uma forma de inibir qualquer tentativa de coação.
Casé Fortes, ao contrário da conselheira, afirmou que os crimes de pedofilia são definidos no Código Penal e no ECA como sendo crimes sexuais com crianças e adolescentes, inclusive os crimes de pornografia. Segundo o promotor, pela definição do direito, os crimes de pedofilia é um conjunto de crimes sexuais definidos que tem como vítimas pessoas menos de 18 anos, violentadas por pedófilos clínicos ou não. Sobre os pedófilos clínicos, Casé Fortes argumentou que muitos não querem tratamento, mas sim praticar o crime.
O promotor citou o trabalho que ajudou a realizar na CPI da Pedofilia, promovida pelo ex-senador Magno Malta entre o início de 2008 ao final de 2010, produzindo 14 projetos de lei, dentre os quais dois viraram leis, um de reclusão de oito anos para pessoas com posse de material pornográfico envolvendo crianças e adolescentes (Lei 11.829/08) e a que incluiu o abuso sexual de menores no rol dos crimes hediondos e estabeleceu pena de 8 a 15 anos de prisão para quem tiver conjunção carnal ou praticar ato libidinoso com menor de 14 anos (Lei 12.015/09).
A delegada de polícia civil de Uberlândia, Lia Velechi, disse que no município não há hoje uma prioridade para responsabilizar criminosos por práticas de violência contra crianças e adolescentes. A delegada queixou a falta de efetivos e de uma delegacia especializada para o atendimento aos casos que envolvem os menores. Segundo Valechi, a delegacia da mulher conta com mais de 500 inquéritos que apuram violência conta criança e adolescentes dos quais 90% são crimes de violência sexual. Destes, 280 são investigações em andamento que ficam prejudicadas por contar com apenas um escrivão e pela ausência da escuta especializada dentro das delegacias
As carências apontadas por Valechi comprometem a punição de indivíduos, levando a e reincidência dos crimes. A delegada também chamou atenção para os casos cada vez mais frequentes de contatos de crianças com pessoas desconhecidas, tendo em vista que mães se relacionam brevemente com parceiros e chegam ao ponto de deixar os filhos em casa com possíveis violentadores, sem qualquer cuidado e praticando uma omissão grave.
O promotor titular de Defesa da Criança e Adolescente de Uberlândia, Epaminondas da Costa, disse que há 17 anos o município sofre de omissões graves do poder municipal e que a Câmara Municipal e a prefeitura têm uma dívida enorme com as mães e as crianças, especialmente com a pandemia, na qual crianças em situação de vulnerabilidade são as mais prejudicadas com o fechamento das escolas. O promotor questionou a abertura de clubes, mas não a das escolas e o comportamento de professores e sindicatos que agem de forma egoísta ao defenderem ficar em casa enquanto que as escolas, que são os ambientes de maior detecção de abusos e violências contra crianças e adolescentes e um espaço real de acolhimento e assistida, ficam fechadas. Ele acrescentou que crianças e mães estão depressivas.
A delegada da Polícia Federal do Rio de Janeiro, Paula Mary , também debateu na audiência. Ela disse que todas as medidas implementadas para proteger as crianças estão se mostrando insuficientes já que os casos de violência vêem aumentando e a gravidade e perversão também. Mary disse que é necessário romper com a idéia romantizada de que a família é o local de proteção e que as crianças estão sendo violentadas através da internet. Ela alertou os pais a monitorarem os filhos.
Paula Mary também enfatizou que a ação conjunta e periódica de vários profissionais ajuda a desvendar os crimes contra crianças e adolescentes e que esse papel não é uma atribuição apenas policial, ao contrário, é um trabalho que requer uma rede completa de profissionais, entre eles, educadores.
O defensor público, Artur Ferreira, citou algumas características do crime de violência sexual contra crianças e adolescentes como o fato de ser escondido e cometido por pessoa que tem acesso à criança; dificuldade de haver uma prisão em flagrante e sem motivo para decretar prisão preventiva (nesses casos, normalmente, o agressor permanece solto e o processo é muito demorado); são crimes continuados, durante vários tempos; subnotificação, o que vai para delegacia, fóruns e gera processo é muito pouco; o relato da violência ocorre já na fase adulta, por isso a necessidade de se trabalhar uma prevenção mais forte, com trabalho de conscientização nas escolas e com os motoristas de caminhão visando à proteção de crianças e adolescentes nas beiras das estradas.
Durante a audiência, os vereadores presentes se comprometeram a lutar por uma delegacia especializada da criança e do adolescente em Uberlândia.
Fonte: Departamento de Comunicação (Emiliza Didier)