Durante mais de seis horas e meia, os membros da Comissão Parlamentar de Inquérito, que investiga irregularidades na renovação dos contratos de concessão do transporte coletivo de Uberlândia ocorrida no início de 2019, fizeram, na tarde desta sexta-feira (14) e início da noite, oitivas com seis servidores públicos da Secretaria de Trânsito e Transportes (Settran). Nos trabalhos da 7ª reunião da CPI de hoje foram reveladas condições precárias dos veículos em circulação das empresas concessionárias São Miguel, Sorriso de Minas e Autotrans vivenciadas por fiscais da secretaria nos terminais de ônibus da cidade.
Os depoimentos mais importantes partiram dos servidores Divino Amarildo dos Santos, 54, fiscal no terminal Umuarama, Flávio Luiz Pereira, 53, assessor de Trânsito, Sandro Marcio Pereira, advogado, Ubiratan Floriano, 60, diretor de Fiscalização e Transportes e Lívia de Oliveira Mamede, psicóloga na Settran.
As oitivas tiveram início com o fiscal Divino Amarildo, que durante os questionamentos feitos a ele pelos membros da comissão, sendo eles os vereadores Thiago Fernandes (PSL), Adriano Zago (PDT) e Wilson Pinheiro (PP), seguidos pelo presidente da CPI, Antônio Borges - Tunico (PL) e pelo relator, Neivaldo Magoo (PSDB), revelou situações precárias e perigosas quanto a manutenção dos veículos que operam nas linhas de ônibus do terminal Umuarama, em especial os de propriedade da empresa São Miguel, chegando a afirmar que problemas e falhas técnicas ocorridas diariamente e notificadas em relatórios colocam em risco a vida dos usuários.
As denúncias foram desde a falta de condições de tráfego, como retrovisores, limpadores, setas e pára-choques quebrados, situações que favorecem a ocorrência de acidentes, outros como derramamento de óleo e superaquecimento dos veículos e ainda casos extremos como a falta de freios nos carros, pneus já sem borracha, ou seja, no arame, e extintores vencidos. O fiscal relatou casos recentes de estouro de pneus dentro do terminal e de falta de freio no trajeto do ônibus que transportava os alunos do Instituto Federal do Triângulo Mineiro, o que levou a um acidente em uma descida. Santos também mencionou a falta de condições de reposição de veículos em casos de acidentes ou nos casos em que, por falta de condições mecânicas e técnicas, os veículos são recolhidos pela fiscalização para garagem.
O servidor afirmou que, em março do ano passado, foi apresentado um documento elaborado em conjunto com fiscais dos três turnos relatando a falta de condições de trabalho no terminal, contudo não resultou em qualquer ação por parte da administração superior.
O servidor relatou também que os descasos foram percebidos a partir do segundo semestre de 2018 e se acentuaram em 2019, piorando com a pandemia de 2020, o que fez reduzir o número de ônibus em 40%. Os casos, segundo ele, têm gerado inúmeros relatórios reportados aos encarregadores de turno, que por sua vez notificam a coordenação, setor responsável por repassá-los à direção de Fiscalização e Transportes da Settran.
Outro questionamento feito foi sobre o número anual de omissões de volta de 9.199, o qual Santos respondeu que essas omissões se referem a situações quando o motorista falta ao trabalho, ou no caso de imprevistos e acidentes que impedem de completar o trajeto da linha. Ele acrescentou que esses fatos geram situações difíceis de contornar, uma vez que trabalhadores não conseguem chegar ao trabalho no horário determinado.
Flávio Pereira foi o presidente da Comissão de Renovação da Concessão do Transporte Público. Questionado sobre o cumprimento da idade limite de 10 anos para os veículos operarem no sistema exigido no contrato inicial, o assessor argumentou que planilhas de custo do contrato de renovação asseguram limites de 10, 12 e 15 anos, a depender do tipo de veículo. Ele afirmou não ter tido conhecimento dos problemas mecânicos dos ônibus à época da renovação do contrato, nem mesmo sobre a regularidade fiscal das empresas necessária para suportar a execução do contrato. A informação foi rebatida pelo vereador Thiago Fernandes ao citar declaração à CPI do sócio-diretor da São Miguel, João Duarte Carvalho que, já no período da renovação, a empresa estava em desequilíbrio financeiro. Pereira se defendeu argumentando que, ao contrário do contrato inicial de concessão, que exigia um caução no valor de R$ 3 milhões para cada empresa que viesse a operar no sistema de transporte coletivo da cidade, o contrato de renovação não fez essa exigência.
Pereira também respondeu a indagações sobre a determinação da redução da frota em 40%, argumentando que, em função do equilíbrio econômico do contrato, com a queda do número de passageiros, é necessária a redução da operação de quilometragem para não aumentar o custo do serviço para o usuário. No cargo em comissão, em 2017, Pereira afirmou que foram encontradas mais de cinco mil multas aplicadas e não lançadas no sistema referentes aos anos da gestão passada da prefeitura.
Um dos questionamentos importantes feito a Pereira foi sobre a propriedade de veículos, CRLV’s, que estão operando no sistema em nome de empresa desconhecida no contrato. Nesse aspecto, Adriano Zago leu edital que determina a propriedade de veículos apenas em nome das empresas concessionárias ou por meio de contrato de leasing. Sobre essa indagação, o servidor afirmou que havia parecer jurídico da Comissão autorizando a liberação dos carros. Pereira também foi questionado sobre o fato de liberar a renovação sem a apresentação da certidão Procuradoria Geral da União por parte da empresa Autotrans. Ele argumentou que o documento foi esquecido na hora de fazer o check list da renovação e que o Ministério Público também não atestou a falta da documentação.
Quem teve que responder também especificamente sobre a atuação na Comissão foi o advogado Sandro Miranda. Ele disse que deu conta da falta da certidão em maio deste ano, que a mesma foi providenciada e anexada ao processo, constando as informações como positivo com efeito negativo. Ele afirmou que foram obedecidas todas as cláusulas para a renovação da concessão, com uma ressalva para a certidão. Contudo, Miranda foi questionado, sendo o único advogado da comissão, quanto ao fato de concordar com parecer jurídico favorável à renovação com veículos em nome de outras empresas. Ele respondeu que o foco era a regularidade da prestação de serviço. Outro embaraço apresentado pelo advogado foi a respeito do pagamento de serviço já prestado a empresas com irregularidade fiscal. Reformulando a resposta, Miranda disse que, numa eventual judicialização, o órgão público é obrigado a pagar mesmo com a irregularidade.
A oitiva terminou com o depoimento do diretor Ubiratan Floriano que, em muitas perguntas, disse não saber responder aos questionamentos, se limitando a explicar que o prazo limite de 10 anos da frota de ônibus contempla, na verdade, até um dia antes de completar 11 anos, que não se lembrava de relatório enviado à direção em março do ano passado e que os casos de problemas mecânicos acontecem diariamente e, sendo verificados os casos como falta de limpeza, problemas mecânicos, os veículos são enviados para garagem e só retornam em condições básicas de uso. O servidor, que era membro da comissão de renovação, disse que não assinou o relatório final da Comissão porque, na época, estava afastado por 30 dias. Ele evitou responder perguntas pontuais e específicas de determinados períodos, generalizando as respostas e alegando lapso de memória.
Fonte: Departamento de Comunicação CMU (Emiliza Didier)